"Choro sobre as minhas páginas imperfeitas, mas os vindouros, se as lerem, sentirão mais com o meu choro do que sentiriam com a perfeição, se eu a conseguisse, que me privaria de chorar e portanto até de escrever. O perfeito não se manifesta."
(Fernando Pessoa, in "O Livro do Desassossego")
Às 18h50 de ontem (25.10.2013), o Sepe através de seu site (www.seperj.org.br) publicou nota comunicando o fim da greve dos professores do município do Rio de Janeiro, enquanto na verdade, nesse horário, iniciava-se o processo "final" de votação (final, pois foram várias votações sem resultado).
Às 19h38, de forma muito confusa e com votos anotados em pedaços de papel, foi feita a comunicação oficial do resultado da votação, quase uma hora depois da comunicação na internet.
As informações podem ser verificadas através do vídeo
Basta observar nas informações do vídeo, o horário do início da transmissão (18h08), em teoria 22 minutos depois deveria ser anunciado o resultado e não é o que acontece.
Às 3h45 (madrugada de hoje) o site da SEPE foi Hackeado e a informação de horário não pode mais ser verificada, mas a equipe do Carranca fez fotografias de todas as telas antes que a invasão acontecesse.
Enfim, o site do SEPE já foi recuperado e está no ar novamente para acalmar os ânimos dos sindicalizados mais exaltados tão contrários a essa invasão hacker que passaram grande parte desse lindo sábado revoltados, discutindo essa ação truculenta, anarquista, individualista e autoritária.
Mas, ao que parece, a única coisa que desapareceu do site do SEPE foi realmente o anúncio antecipado do resultado da assembleia de ontem, 25/10/2013, com o respectivo horário de postagem.
Ontem foi, de longe, um dos dias mais tristes pra mim. Depois de mais de dois meses de luta intensa e com os nervos à flor da pele, acaba a greve da rede estadual de ensino. E perdemos a luta. Perdemos feio...
A minha tristeza não é pela derrota em si. Sou da base da pirâmide social. Sou do povo, sou um dos "zé ninguém". E, como se não bastasse, eu me oponho a essa realidade hipócrita e desigual que me cerca. Para quem está nessa posição, tomar na cabeça não é novidade. É preciso saber viver as derrotas.
Mas a minha tristeza e indignação está na forma como a derrota se deu. Quando cheguei na assembleia hoje, percebi que muitos dos que estavam ali nunca tinham ido às assembleias, sequer participaram do movimento grevista. Rostos que, ao que parece, costumam aparecer em momentos estratégicos, para neutralizar uma luta que não foi lutada por eles, mas por outros colegas de profissão que, corajosamente, enfrentaram Deus e o resto do mundo para defender uma educação de qualidade e popular.
Muitos colegas grevistas estavam cansados, e queriam jogar a toalha, sobretudo depois da facada nas costas que a direção do sindicato deu na própria categoria que ela deveria defender. Esses colegas eu respeito, pois joga a toalha quem briga e chega no seu limite. Mas se mobilizar para votar contra um movimento do qual não se fez parte, isso é, para mim, o cúmulo da imoralidade, da falta de caráter.
É muito complicado se opor à ordem social na qual se vive. E aqui no Brasil vivemos numa realidade particularmente cruel. Uma democracia que permite que partidos recebam "doações" (na verdade, investimento) de grandes empresas; com currais eleitorais dominados por milicianos; com a grande mídia totalmente comprada; e com um governo que funciona seguindo uma lógica própria, a lógica dos "Amigos dos Amigos", à revelia dos anseios da população.
Ainda assim, mesmo dando murros em ponta de faca, eu prefiro me opor a essa realidade social mesquinha e violenta na qual vivemos do que me calar diante dela. Calar-se diante das injustiças é ser tão imoral quanto a própria injustiça. Eu me recuso a fazer isso.
A greve da educação, pelo momento no qual ela foi deflagrada, tinha tudo para obter ganhos históricos de fato. Mas perdemos porque lutamos contra um governo truculento e descompromissado com a população; perdemos porque lutamos ao lado de um sindicato que serve mais a seus interesses partidários do que a qualquer outra coisa; e perdemos porque muitos dos colegas docentes que reclamam de tudo e de todos na sala dos professores simplesmente se fizeram de mortos diante da greve, isolando quem teve coragem para dar a cara a tapa.
To profundamente triste e me sentindo derrotado como poucas vezes me senti na vida. Penso nos meus alunos e na minha escola sem a mínima infraestrutura para atendê-los, uma das milhares de escolas-de-faz-de-conta da rede estadual de ensino. Achei que sairia dessa greve com alguma garantia de melhoria para eles. Mas saio dela da mesma forma que entrei: um professor solitário, que se sente matando um leão por aula para tentar estimular seus alunos a viverem uma instituição que não os representa e não os acrescenta em nada.
Mas faço e sempre farei das minhas aulas uma tentativa de apresentar aos alunos uma interpretação crítica e contestadora do mundo e uma ideia de como agir nesse mundo, no sentido de mudá-lo. Mesmo com um mísero tempo de aula por semana, isso o Estado e a direção Sepe não conseguirão tirar de mim...
Até a próxima, meus caros..
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SEPE vendidos, não me representa
A trilha sonora abaixo faz parte do 'VANDALIRISMO'
A grande lição que fica dessa linda mobilização dos professores arrastando multidões nas ruas é que depois de uma batalha perdida é preciso curar os ferimentos, se reorganizar e continuar lutando contra esse sistema tão injusto.
Todas as vezes que uma greve dos professores é interrompida dessa maneira pelega pelo sindicato a sensação de traição é muito estranha e incômoda. É uma tristeza absurda vê-los derrotados mais uma vez pelo sistema e suas orquestrações ordinárias.
Sei que muitos pais, alunos de escolas públicas, e muitos colegas da graduação discordarão de mim. Pensam que ganharão alguma coisa com essa reposição de aulas e com seus diplomas nas mãos no tempo previsto. Mas na realidade é a sociedade que perde quando essa grande massa acredita que o caos educacional que vivemos é culpa do professor ou das greves. O Estado realmente é muito bonzinho conosco, não é?
Reposição de aulas não mudará nada futuros pedagogos iludidos! Muitos de nós depois de formados seremos apenas mão de obra abundante e mais barata para atender os interesses governamentais desse país. Da mesma forma que os estagiários são para a Prefeitura do Rio.
Como bem ouvi de Miguel Arroyo ano passado num Colóquio na UFF - "As questões a serem pensadas em educação são muito sérias", e ouso acrescentar que as intenções políticas e econômicas mundiais por trás dessa nossa educação pública devem ser as piores para a grande público que dela precisa, os pobres brasileiros.
Afinal, a burguesada que educa seus herdeiros em boas escolas particulares para o mando e para a política, precisa de trabalhadores pobres, dóceis, mediocremente educados que se sujeitem à baixos salários para manter tudo como está. Se houver mudança nesse esqueminha fuleiro fica ruim para quem? Para mim é que não é.
Quando você percebe a manipulação dos noticiários alinhavada com os interesses eleitoreiros dá nojo. Mas quando você atenta para essa alienação de futuros professores que ainda se enxergam infantilmente apenas como 'alunos' em formação sendo prejudicados com a greve ou quando suspendem o jantar no ISERJ, dá pena e medo do futuro da nossa educação pública e da merenda escolar das crianças. Sério, sem ironia ou sarcasmo. E isso é muito grave quando você pensa o que é essa ideia de educação pública nesse modelo que um dia acreditei, mas agora entuba sorrindo e sem vaselina professores grevistas, alunos apoiadores e ainda recebe aplausos pelo final da greve.
Coloca na conta do Cabral, do Dudu e desse sindicato pelego. Perfeito, Dilmão!
Privatiza a educação pública também, já que nunca sobra verba pública para reais investimentos nela!
Enfim, o fato é que se a greve dos professores acabou dessa forma tosca e banal, sem nenhuma reivindicação atendida, a luta certamente continuará. É vida que segue com sabor de derrota e desejo de justiça. Mas não essa justiça do Luiz Fux, ok?
E a todos os bravos mestres que participam dessa luta, que me inspiram mudanças, me dão consciência do meu papel político na educação e me tiram dessa condição de 'ser sem luz' buscando apenas uma diplomação, dedico essa música com o meu carinho, respeito e admiração. Sempre.